Rede de contravenção de
Cachoeira contava com policiais e delegados da PF
Oficiais vazavam informações privilegiadas e
driblavam até a ação da Força Nacional de Segurança
BRASÍLIA - Além de elos
com políticos, a organização criminosa comandada pelo contraventor Carlos
Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira, tinha sob suas ordens dois delegados da
Polícia Federal e 30 policiais militares, que vazavam informações privilegiadas
e driblavam até a ação da Força Nacional de Segurança, quando atuava na repressão
a jogos ilícitos em Goiás e nos arredores de Brasília.
De acordo com
investigações da Operação Monte Carlo, que levou o contraventor - acusado de
comandar uma rede de jogos ilegais - à prisão em fevereiro, R$ 200 mil teria
sido o valor pago por Carlinhos Cachoeira para contar com os serviços do
delegado da Polícia Federal Fernando Antonio Heredia Byron Filho, também preso
na operação.
Byron integrava o
time de interlocutores de Cachoeira que, como o senador Demóstenes Torres (Sem
partido-GO), se comunicava com o contraventor por meio de aparelhos de rádio
Nextel habilitados no exterior para tentar escapar de escutas telefônicas. Seu
papel era garantir a exploração de máquinas de caça-níqueis, vazar e direcionar
investigações, a pedido de Cachoeira, a quem se refere como “guerreiro velho”.
O contraventor o chamava de “doutor”.
Apartamento.
Em agosto do ano passado, Byron
prestou contas de um serviço para o contraventor e aproveitou para pedir um adiantamento
de dinheiro para pagar um apartamento. A conversa telefônica foi interceptada
pela operação Monte Carlo. A outro delegado da PF preso na operação, Deuselino
Valadares dos Santos, o preço pago por Cachoeira foi bem mais alto.
Conhecido na organização
como “Neguinho”, Deuselino Valadares foi cooptado quando chefiava a Delegacia
de Repressão a Crimes Financeiros da Superintendência da Polícia Federal em
Goiânia. Auditores fiscais atestaram enriquecimento do delegado, incompatível
com os rendimentos declarados ao Fisco.
Em 2011, ano em
que foi afastado do cargo, Deuselino e sua mulher, Luanna Bastos Pires
Valadares, teriam comprado à vista uma fazenda no município de Juarina, no
Tocantins, por mais de R$ 1 milhão. Luanna também seria sócia de um “laranja”
de Cachoeira numa empresa de segurança, a Ideal.
Antes de ser
cooptado pelo contraventor, Deuselino assinou relatório de outra investigação,
no qual o senador Demóstenes Torres aparecia como destinatário de 30% dos
ganhos de Carlinhos Cachoeira.
Segundo reportagem
da revista Carta Capital, um último relatório assinado pelo delegado
da PF, em maio de 2006, exibia, com detalhes, o esquema do “proprinoduto” de
Cachoeira, do qual passaria a fazer parte.
Demóstenes.
As ligações do senador
Demóstenes Torres com o contraventor voltaram a ser investigadas pela Polícia
Federal em 2008, em outra operação de combate ao jogo ilegal, a Las Vegas. As
conversas do senador com Carlinhos Cachoeira foram grampeadas na ocasião. O
inquérito da PF foi encaminhado à Procuradoria-Geral da República em 2009, mas
o procurador Roberto Gurgel optou por não repassar a informação ao Supremo
Tribunal Federal (STF).
A relação de
Demóstenes Torres e Carlinhos Cachoeira começara havia anos, quando o senador
era secretário de Segurança em Goiás, durante o primeiro mandato do governador
Marconi Perillo (PSDB). Isso ocorreu antes de o contraventor aparecer como pivô
do primeiro escândalo do governo Lula, a partir da divulgação de um vídeo em
que Waldomiro Diniz, então subchefe de Assuntos Parlamentares da Casa Civil,
subordinado ao então ministro José Dirceu, foi flagrado negociando propina com
o contraventor no processo de legalização dos jogos.
Teia
política. As investigações
mostram que Carlinhos Cachoeira mantinha esquema de contatos políticos e com
agentes da área de segurança, para garantir prosperidade aos seus negócios.
Demóstenes Torres transitou nos dois grupos. Do esquema do contraventor também
fariam parte seis delegados da Polícia Civil e 30 policiais militares.
Preso na operação
Monte Carlo, o comandante da Polícia Militar de Luziânia (GO), major Uziel
Nunes dos Reis, foi um dos que prestaram serviço a Cachoeira. Em agosto do ano
passado, o major teria contribuído para evitar o fechamento de bingos
clandestinos pela Força Nacional de Segurança. A apreensão de máquinas
caça-níqueis no entorno de Brasília abalava a contabilidade do grupo. Uma única
casa de jogos clandestina faturava cerca de R$ 1 milhão por mês.
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